Sem que percebamos, as decisões políticas interferem nas nossas vidas. Trata-se de algo contraditório, uma vez que é o cidadão que, na democracia vigente no Brasil e em boa parte do mundo, escolhe o corpo político. Nem a educação foge dessa realidade, como no caso do Instituto Politécnico da UFRJ em Cabo Frio, onde uma rixa entre o Estado do Rio de Janeiro e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) prejudicou o andamento do inovador projeto da instituição federal.
A burocracia, característica do meio político atual, se revela já quando o governo fluminense permite que uma documentação de caráter tão importante quanto um acordo entre instituições de ensino, fique em trâmite no seu sistema do segundo semestre de 2008 até o mesmo período do ano de 2009. Segundo o coordenador da UFRJ, Luís Henrique da Costa, o Estado se posicionou como se o Protocolo de Intenções assinado um ano antes nunca tivesse existido. Ainda foi possível ver outro traço dessas relações burocráticas quando procuramos a diretora da Escola Estadual Praia do Siqueira, Maria Fausta de Souza. Ela se recusou a expor a posição do Estado quanto aos conflitos, alegando que sua posição na hierarquia do governo tornava impossível até mesmo uma entrevista sem gravação de imagem e som.
Tudo teve início ainda na Antiguidade, quando Platão (428-347 a.C.) e Aristóteles (384-322 a.C.) publicaram, respectivamente, as célebres “A República” e “Política”. Ambas deixavam claro que política é a busca pelo bem-comum, pela felicidade dos cidadãos, o que se realizava, na Grécia daquele tempo, de forma contrastante com a que observamos hoje. Todos os cidadãos, mesmo que estes fossem apenas uma parcela da população visto que vivia-se numa sociedade escravista, votavam nas decisões referentes a vida pública. As leis, a execução das mesmas e todo processo que hoje escolhemos alguns para realizar, na Grécia era posto a votação popular. Este era o conceito por eles guardado de democracia.
Apesar disso, os dois também concordam que todas as formas de organização estatal existentes até aquele momento da História ou naturalmente se corrompiam ou eram corrompidas por si só. Sendo assim, torna-se nítida a tendência do homem a se corromper quando detêm poder, independentemente até do número de pessoas que estão próximas deste poder.
A solução apresentada para tal problema é a divisão dos poderes, algo levantado por Políbio com o denominado governo misto, e que seguiu sendo discutido no decorrer de toda história do pensamento político. Inicialmente, nada mais era do que as três melhores formas de governo se contrapondo: o rei representando a monarquia, o senado a aristocracia e o povo a democracia. Em Montesquieu, chega-se ao momento de evolução maior desse sistema, onde na denominada “monarquia constitucional”, há a divisão não de acordo com a tipologia clássica, mas sim nas esferas executiva, legislativa e judiciária.
Baseado na idéia de que “um poder constitui um freio para outro poder”, como diria Montesquieu, chegamos a democracia representativa vigente na maioria dos países. Nesse ponto, voltamos ao questionamento inicial sobre a separação drástica entre a vida pública e a vida social: a participação do povo se limita ao voto, enquanto o poder das decisões coletivas fica nas mãos de uma minoria. Dessa forma, é possível perceber a distância que se criou da democracia plena, aquela vivida pelos cidadãos gregos da Antiguidade, e a que se desenvolveu no mundo moderno.
É, entretanto, no século XIX que se desenvolve a grande crítica de todas as tipologias de governo analisadas e propostas pelos pensadores de todos os tempos. Para Karl Marx, todas essas classificações chegam a um ponto comum: o Estado como instrumento da classe dominante para a manutenção da “ditadura da burguesia”, onde o antagonismo das classes deve se perpetuar afim de manter o domínio burguês. A famosa frase do “Manifesto do Partido Comunista”, de 1848, sintetiza essa idéia: ”No sentido próprio, o poder político é o poder de uma classe organizada para oprimir outra classe”.
É importante observar que Marx tem a favor dos seus argumentos exemplos de opressão da classe dominante sobre outra, desfavorecida. As relações econômicas, dessa forma, mostram-se sempre ligadas intimamente com as relações políticas: na Antiguidade, uma sociedade escravista que utilizou-se da escola para preparar os políticos, sendo que só freqüentavam essa instituição os que tinham tempo ocioso, ou seja, os ricos; na Idade Média, o sistema servil obrigava a parcela mais pobre a passar toda vida trabalhando e devendo ao Senhor Feudal; das Revoluções Comercial e Industrial inglesas aos nossos dias, os países que mais produzem e geram riquezas se consolidando como as potências políticas mundiais.
Partindo do princípio marxista, Wevergton Brito Lima, diretor de comunicação estadual do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), nos cedeu uma entrevista, na qual tentamos tornar claro o funcionamento do aparelho estatal nos nossos dias.
Para começar, ele afirmou que “política é todo tipo de interação, seja ela interpessoal ou intersocial”, explicando que até mesmo um acordo entre pai e filho para decidir o tempo de estudo e lazer do jovem, é uma relação política.
Wevergton seguiu elucidando o papel das coligações firmadas entre partidos políticos, que, na sua opinião, nada mais são do que “representação de camadas sociais”. Ele fez uma comparação com as táticas de guerra, usando o exemplo da Segunda Guerra Mundial, quando “Estados Unidos e União Soviética não acabaram com suas diferenças, tanto que entraram em conflito logo após a guerra, mas estiveram juntas enquanto a luta contra o inimigo comum, o nazi-fascismo, se manteve”. Explicando a analogia, “as coligações se formam com base no denominado programa mínimo, o ponto da ideologia de cada partido que se assemelha. O PT, o PCdoB e parte do PMDB, por exemplo, possuem programas diferentes (até porque se fossem iguais não estariam divididos, seriam todos um só), mas se unem para indicar um candidato que atenda a esse tal ponto comum e a parte do programa de cada partido. Como numa guerra, é praticamente impossível vencer sozinho. Só em casos de apelo popular muito forte isso acontece.”
O membro do PCdoB também abordou a questão da alienação política brasileira, encontrando pontos-chaves na educação e na mídia. Ao primeiro, ele argumenta que “sempre sofremos com a educação sendo exclusividade das elites. A conseqüência desse fenômeno histórico é um povo que não possui nem o hábito da leitura nem da reflexão crítica”. Sobre a mídia, “diferentemente do que aconteceu, por exemplo, com alguns países europeus, o Brasil desde o início teve as concessões televisivas dadas a empresas, o que significa que os fins de um dos principais difusores de cultura da nossa sociedade estivessem sempre relacionados ao lucro. Na Inglaterra, como exemplo oposto ao brasileiro, as redes se iniciaram sendo vinculadas ao governo, o que reflete hoje numa instituição como a BBC, uma das maiores emissoras do mundo e que tem uma grade recheada de conteúdos culturais”.
Não é difícil encontrar um conceito para política, mas não se pode, em hipótese alguma, negar que sua influencia para a sociedade seja impetuosa e constante. Como vimos, nem mesmo a escola foge desse roteiro. Sendo assim, estejamos atentos a vida pública, ainda mais num momento como o que vivemos, às vésperas das eleições. Que o espírito presente em Analfabeto Político, de Bertolt Brecht, pensador alemão da primeira metade do século XX, faça-se sempre presente:
“O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais.”
sexta-feira, 18 de junho de 2010
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